segunda-feira, 11 de março de 2013

VENDER CRÉDITOS FERE LEI FISCAL, DIZ TCU

Sujeitos a limites de endividamento, prefeitos e governadores estão comprometendo o caixa de gestões futuras com operações financeiras moldadas para driblar a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). Em vez de recorrer a empréstimos tradicionais, submetidos ao aval da Secretaria do Tesouro Nacional (STN), ofertam a investidores, em troca de receita antecipada, recursos a serem pagos por créditos da dívida ativa. Pareceres do Tribunal de Contas da União (TCU) apontam irregularidades na manobra e alertam para os riscos à saúde financeira de Estados e municípios. 

Com foco em operação da Prefeitura de Belo Horizonte, a fiscalização põe em xeque captações de natureza idêntica, lançadas pelos governos de São Paulo e Minas Gerais - que já obtiveram quase R$ 1 bilhão por meio de "cessões de direitos creditórios". Cidades de grande porte, como a capital paulista, pretendem fazer o mesmo. Em instituições oficiais, como o Banco do Brasil, os pedidos de gestores públicos se avolumam. 

Para contornar essas regras, prefeitos e governadores classificam as operações como "alienações de direitos" ou "vendas de ativos", e não operações de crédito. Oficialmente, o poder público continua como titular da dívida ativa, com a prerrogativa de cobrar os débitos atrasados de contribuintes inadimplentes. Na prática, a receita que será obtida por meio das cobranças é usada para remunerar os investidores, a taxas generosas. 

Para a área técnica do TCU, que já concluiu relatório a respeito, e o Ministério Público de Contas, trata-se, sim, de uma operação de crédito como previsto na LRF, cabendo aos gestores submeter as operações às exigências da lei. O principal argumento é que, a despeito do rótulo dado pelos gestores, as operações pressupõem obrigação financeira por parte dos Estados e municípios. Como ocorre nos empréstimos tradicionais, em troca de dinheiro antecipado, promete-se entregar, no futuro, dinheiro acrescido de juros. 

O processo corre em sigilo no TCU, sob relatoria do ministro Walton Alencar, que preparará voto baseado nas conclusões da área técnica e levará o caso a julgamento.


Para Estados e municípios, captação nada tem de ilegal

Os Estados sustentam que as operações não foram lançadas para dissimular endividamento ou burlar regras da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF). De acordo com a Secretaria da Fazenda de São Paulo, o principal motivo para fazer a "cessão de direitos creditórios" foi evitar o risco de variação cambial dos financiamentos externos. Segundo a pasta, a LRF só proíbe a antecipação de receita tributária nos casos em que o fato gerador ainda está por ocorrer - o que, na avaliação da secretaria, não ocorre. Além disso, ela argumenta, em nota, que o Estado só tem o dever de remunerar os investidores se houver arrecadação ou fluxo de caixa no futuro.

Em outras palavras, não há garantias - como acontece nos empréstimos tradicionais. O que significa que o risco é da outra parte. "A operação só feriria a Lei de Responsabilidade Fiscal se o Estado ficasse coobrigado pelo efetivo pagamento", explicou, em nota, a secretaria. Para o Ministério Público junto ao TCU, praticamente não há que se falar em risco, pois o montante de dívida ativa envolvido nos negócios é abundante e a receita, sempre suficiente para remunerar os investidores. 

A Secretaria da Fazenda de Minas também alega que o governador pode dispor de créditos gerados no passado, mesmo tratando-se de dívidas parceladas em longo prazo, cuja expectativa de arrecadação é para os anos que virão. "Não estou sacrificando receitas futuras, porque o fato gerador é pretérito", argumenta o subsecretário do Tesouro Estadual, Eduardo Codo. 

Para ele, não há vedação legal às operações e a abordagem do TCU é equivocada. "Não estamos buscando receitas de maneira irresponsável." A Prefeitura de São Paulo negou que pretenda fazer operação de crédito "na surdina". "Não estamos fazendo dívida, mas uma cessão de ativos. O município não estará garantindo risco, que é todo do investidor", ressaltou o secretário adjunto de Finanças, Antônio Paulo Vogel de Medeiros. A Prefeitura de Belo Horizonte não quis se pronunciar, alegando que o caso ainda está sob análise do TCU.

Nenhum comentário:

Postar um comentário