terça-feira, 28 de dezembro de 2010

TJRJ ADMITE ARBITRAMENTO EM ESTORNO DE CRÉDITO DE ICMS

Em recente decisão proferida pela 18ª Câmara do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, restou decidido que nos casos em que a mercadoria sofrer perecimento ou for perdida, como em situações de furto ou extravio, é dever do estabelecimento estornar o crédito decorrente da operação de aquisição, já que não ocorrida a circulação posterior de tais produtos a confirmar o princípio da compensação no regime da não-cumulatividade do ICMS. Dentro do mesmo processo também se debate se pode o fisco arbitrar o valor indevidamente compensado.
A Desembargadora Relatora do caso entendeu que o artigo 23, da Lei Complementar 87/96, condiciona a compensação à documentação idônea, não afastando a obrigatoriedade do estorno nas situações previstas em lei, afirmando que “... se ocorreu uma compensação do imposto tributado em operação anterior com o tributo a ser pago na operação posterior e se nessa operação a mercadoria se perdeu no estabelecimento, o crédito fiscal correspondente deve ser estornado, pois não houve a operação típica de circulação da mercadoria a ensejar o creditamento, pois a mercadoria não saiu do supermercado, lá deteriorando-se”, disse.
No tocante ao arbitramento, a Desembargadora entendeu que o contribuinte deve apresentar as provas que lhe cabem durante o transcurso do processo administrativo, o que lhe possibilitaria determinar especificamente o crédito tributário devido ao erário por conta do indevido crédito tomado.
Consignou a Magistrada que “... o Embargante, ao exercer o direito de avaliação contraditória no curso do respectivo processo administrativo, não exibiu os elementos necessários e suficientes no sentido de comprovar o exato valor das operações realizadas ou a inexistência do fato gerador da obrigação tributária.”, reforçando ainda que “... não cabe à autoridade fiscal ‘fornecer provas suficientes e cabais contra o contribuinte’ (fl. 29), mas este é quem deve efetuar as operações tributárias nos termos da lei ou justificar também na forma da lei a impossibilidade de fazê-lo ou, ainda, comprovar que o Fisco atua de forma indevida e ilegal.”.
O alerta é para o fato de que muitas empresas acabam sofrendo com a perda de produtos que estão dentro do sistema não-cumulativo do ICMS e não observam algumas questões de absoluta importância para se resguardarem de infortúnios como o que aconteceu no caso do julgamento comentado.
Um exemplo a ser lembrado de caso similar é aquele relacionado aos postos de gasolina que laboraram muito contra a incidência do Imposto Estadual sobre o valor integral da nota fiscal, já que a quantidade ali declarada muitas vezes não correspondia àquela entregue, visto que o combustível evaporava durante o transporte ou quando da transferência de armazenamento para o caminhão e deste para os tanques do posto. Isso abriu a possibilidade destes contribuintes comprovarem o perdimento de parte da mercadoria e tributar somente o que efetivamente tenha circulado e ingressado em sues estabelecimentos.
Para os supermercados, a questão controvertida está, principalmente, no caso de produtos que sofram com o perecimento, como os hortifrutigranjeiros, e com os furtos e desvios ocasionados dentro dos estabelecimentos. Dentro da teoria da assunção de risco do investidor privado, cabe a este arcar com tais circunstâncias; contudo, na seara tributária este assunto enseja muitas discussões.
De acordo com a decisão tomada pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, a Constituição Federal autoriza à Lei Complementar determinar o estorno do crédito quando a mercadoria não realizar a circulação completa, ou seja, entrada no estabelecimento com o devido pagamento do Imposto e saída tributada. Esse tema já foi debatido pelo Supremo Tribunal Federal no âmbito do Imposto sobre Produtos Industrializados em que, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 566.819, ficou esclarecido que a não-cumulatividade “... não é instrumento de tributação do valor agregado, é isto sim um mecanismo que se limita a autorizar a dedução exata do imposto já suportado na entrada”, afirmativa da Ministra Ellen Grace.
Há os que defendam que o sistema da não-cumulatividade deva cumprir sua função de desonerar a cadeia produtiva e, portanto, no caso do ICMS, somente a isenção e não-incidência é que ensejam o estorno do crédito, já que são as únicas hipóteses expressamente previstas pela Constituição Federal.
A par dessa discussão, o que mais ressalta aos olhos no caso do julgamento do Tribunal de Justiça fluminense é o dever do contribuinte em deter a comprovação do valor creditado indevidamente para que não transfira ao fisco o direito de arbitrar o montante a ser lançado, afastando dos agentes públicos o dever de perseguir, de todas as formas possíveis, a determinação do valor tributável.
Essa posição, ainda que temperada com a idéia de que é dever do contribuinte comprovar documentalmente seu direito, também retira do órgão fiscalizador, de certa forma, a responsabilidade do necessário esforço para que busque o valor tributável, utilizando-se de metodologia menos precisa como o arbitramento. Sempre importante lembrar que o tributo somente pode ser exigido por lei e nos limites dessa; portanto, deve o órgão fiscalizador realizar esse intento.
Os dois temas suscitam debates jurídicos profundos e que devem seguir para as instâncias superiores, merecendo atenção para sabermos qual o entendimento que se dará ao caso, até para que possamos melhor avaliar e orientar a forma de atuação das empresas que enfrentam situações dessa natureza  frente ao direito na prática dita pelos tribunais brasileiros.

Leia a íntegra da decisão (clique aqui)

Ricardo Preis
Sócio da SP&CB - Negócios Jurídicos

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